por Nishikigoi
Texto por: Victor Silvares – autor e administrador do blog
Sadame – Graduando em Letras e Literatura Japonesa pela Universidade de
Brasília
1 – Budismo
O Budismo é uma religião criada na Índia, mas
onde atualmente é o Nepal. O Budismo surge numa sociedade estagnada, onde o
papel do indivíduo é determinado por sua casta, que lhe é transmitida por laços
sanguíneos. A manutenção dessa estrutura é feita pelos costumes religiosos da
sociedade Hindu. Com a incapacidade de ascensão e o engessamento social, uma nova
estrutura começa a ser necessária.
É exatamente neste contexto que por volta de
500a.c nasce Siddartha Gautama, que posteriormente é conhecido como Buda ou
Shakyamuni. Siddartha faz parte da sociedade Hindu, e faz parte de uma família
influente. Para que Siddartha possa assumir o comando desta família com
sucesso, a verdade sobre o mundo lhe é escondida..Siddartha vive numa sociedade
utópica onde todos são ricos, a doença e velhice não existem e a morte não é
sequer um problema.
Certo dia Siddartha tem contato com o mundo
exterior e fica perplexo. As suas primeiras visões são pessoas com fome,
doentes, velhos e pessoas mortas. Neste momento Siddartha deixa de ser apenas
um Nobre e dá seus primeiros passos ao que posteriormente será chamado de
Budismo.
Siddartha não admite a verdade sobre o mundo,
enquanto uns vivem com conforto e luxo, outros sofrem e são tratados como
animais. Ao se deparar com essa dicotomia, Siddartha deixa sua vida luxuosa
para que possa meditar sobre a humanidade. Ao se retirar de seu palácio,
Siddartha tem contato com ascetas que vivem nas florestas, longe da civilização
e de qualquer materialismo. Siddartha se torna um desses ascetas e passa
a viver de uma forma que todos os prazeres lhe são privados. Todo o seu tempo é
destinado à meditação e à busca da iluminação e da verdade.
Anos se passam e Siddartha não percebe nenhuma
evolução, mas a verdade lhe parece próxima, já que ao viver no extremo luxo e
na extrema negação dos prazeres nada lhe foi revelado, o que pouco à pouco se
revela é a existência de um caminho do meio, ou seja, viver distante dos
excessos. Com esta nova verdade, Siddartha ao meditar sobre um pé de figueira,
atinge a iluminação, ou Nirvana, que é o termo traduzido do sânscrito. Neste
momento passa a ser chamado de Buda, que significa ‘O Iluminado’.
Buda passa a ensinar sua nova filosofia até os
seus últimos dias, conseguindo assim muitos discípulos, que convencidos de seus
ensinamentos passaram a transmiti-los de forma a criarem as primeiras
sociedades monásticas ou Sangha.
Na visão Hinduísta, Buda não criou uma nova
religião e sim aparece como um avatar da divindade Vishnu, que vem ao mundo
para acabar com os rituais de sacrifício que eram realizados até então.
Siddartha é considerado o 9°(nono) avatar de Vishnu. Seu antecessor é Krishna
(importante figura da religião hindu, tratada como dividade), 10° (décimo)
avatar ainda está por vir.
Esta é uma versão padrão de como surge o
Budismo e como Siddartha atinge a iluminação. Como toda história religiosa
alguns floreamentos são adotados, com o exemplo do Budismo Tibetano, ou
Lamaísmo, onde ao nascer, Siddartha começa a andar, e onde dá seus passos
flores de Lótus aparecem. Mas também é um fato que Siddartha é realmente uma
figura histórica, e não apenas um personagem mítico.
O Buda histórico não deixou nenhum sermão
escrito, e transmitiu toda a sua filosofia de formal oral, posteriormente
alguns discípulos passam a escrever seu ensinamentos, como é o caso do Concílio
de Páli, onde após sua morte, seus discípulos se reuniram e ditaram todos os
ensinamentos para que estes fosse registrados de forma escrita. Apesar desses
acontecimentos, o Budismo não adota nenhum livro como cânone e algumas escolas,
como a Zen, desprezam o conhecimento escrito.
Os alicerces da filosofia Budista são dados
pelas Quatro Nobres Verdades, que é o conhecimento primordial para que se possa
compreender o Budismo. As Quatro Nobres Verdades são:
1 – A
Verdade do Sofrimento – Viver é sofrer;
2 – A
Verdade da Origem do Sofrimento – Todos os tipos de sofrimento tem uma origem
comum, o desejo;
3 – A
Verdade do Fim do Sofrimento – Ao renunciarmos o desejo, deixamos de sofrer;
4 – A
Verdade do Caminho para o Fim do Sofrimento – O Nobre Caminho Óctuplo.
A quarta nobre verdade nada mais é que a introdução
a outro importante conceito para a compreensão do budismo, o Caminho Óctuplo é
a manifestação do Caminho do Meio, verdade na qual levou Buda à Iluminação. O
Caminho Óctuplo é:
1-
Compreensão Correta;
2-
Pensamento Correto;
3- Fala
Correta;
4- Ação Correta;
5- Meio de
Vida Correto;
6-Atenção
Correta;
7-Sabedoria
Correta;
8-Visão
Correta.
Posteriormente estes caminhos foram agregados
da seguinte forma:
1-
Compreensão Correta;
2-
Pensamento Correto;
3- Fala
Correta;
– Moralidade
4- Ação
Correta;
5- Meio de
Vida Correto;
6-Atenção
Correta;
–
Concentração
7-Sabedoria
Correta;
8-Visão
Correta.
– Sabedoria
Baseados nesses princípios, o Budismo começa a
se expandir pelo mundo. Os discípulos de Buda começam a expandir os seus
ensinamentos, a ponto de que o conhecimento budista chega a toda a Ásia.
Os diferentes modos de abordagem dão início a
diferentes escolas budistas, existe uma ramificação inicial em que divide o
budismo em três (3) vertentes
Mahayana¹ –
Budismo que engloba a maioria das escolas. Se instalou basicamente no Leste
Asiático em países como China, Coréia e Japão. Ex: Nichiren, Chan, Zen, Jodo
Shu, Jodo Shin Shu;
Theravada –
Budismo que se instalou no Sudeste Asiático em países como Tailândia e
Indonésia, é o Budismo mais próximo do Budismo Primordial, e por este fato, é
onde se encontra as escolas mais antigas de Budismo e algumas das escolas mais
ortodoxas.
Vajrayana² –
Budismo esotérico, na qual fazem parte as escolas Tibetanas, Shingon e Tendai.
¹Alguns
estudiosos usam o termo Hinaiana para se referir ao Budismo Theravada, este
termo surge de uma forma preconceituosa, mas hoje é usado sem esse intuito.² O
Budismo Vajrayana é considerado em algumas obras, como uma ramificação do
Budismo Mahayana.
Existem discussões sobre o Budismo ser ou não
um religião. Alguns o consideram apenas como filosofia, pois a não existência
de uma divindade não o caracteriza como religião. Mas com o seu forte apelo a
conceitos morais e regras de conduta estabelecidas, é deveras simples
considerar apenas como filosofia e negar todo o seu lado religioso.
2 – Budismo no Japão
O Budismo foi introduzido no Japão, por meio
da Coréia, no ano de 552(Período Asuka). Não foi aceito de imediato e uma
série de conflitos aconteceram para que este fosse aceito, conflitos estes que
não diziam respeito apenas à religião, e sim a disputas de poder. Alguns nobres
se encantaram pelos ensinamentos budistas. Provavelmente a causa para a
instalação do Budismo entre os nobres fosse a quebra com os costumes Xintô,
criando assim uma diferenciação entre a religião do povo e da nobreza. E foi o
que de fato aconteceu, o Budismo se implanta primeiro na casa imperial, e no
ano de 587 é declarado como religião oficial do estado.
De fato, o Budismo foi um fator organizacional
para o Japão. Introduzindo a escrita chinesa e sistematizando a sociedade. O
termo Xintô só passou a existir após a introdução do Budismo no Japão, o termo
foi criado para diferenciar o Budismo da religião nativa praticada no Japão.
Não existindo centros de ensino sistematizados na sociedade até então, o
Budismo passa a introduzir a cultura chinesa no Japão, aos poucos os
costumes, a arquitetura, as tecnologias, ciências, tecelagem , militarismo,
entre outras influências. Também é importante ressaltar que à partir dos templos
budistas, a escrita foi sendo desenvolvida e ensinada, criando aos poucos
uma escrita japonesa que se difere da chinesa.
O Budismo aos poucos se adapta aos costumes
Xintô e cria uma especie de simbiose religiosa, para se adaptar aos costumes
japoneses, o Budismo toma emprestado alguns costumes e tradições. Aos poucos
essas interações inter religiosas dão uma característica singular ao Budismo no
Japão, que pouco a pouco vão o tornando diferente do Budismo praticado no
restante da Ásia.
Porém, as escolas implantadas não são
genuinamente japonesas, precisando frequentemente de monges vindos da China
para pregar seus ensinamentos. Alguns monges japoneses são mandados à China
para estudar o Budismo. No Período Heian, estes monges passam a desenvolver um Budismo
que está mais próximo da sociedade japonesa, há um sincretismo maior entre as
os costumes nativos e pouco a pouco o Budismo passa a se instalar nas mais
diversas partes do Japão. As principais escolas budistas deste período são a
Shingon e Tendai.
Mas o problema elitista ainda existe, as
escolas Budistas são voltadas para a nobreza e estão intimamente ligadas a
interesses políticos. No meio deste panorama escolas genuinamente japonesas
passam a ser criadas. No período Kamakura temos a criação do Budismo Nichiren,
expansão do Budismo Jodo Shu e Jodo Shin Shu, e a instalação das primeiras
escolas do Budismo Zen no Japão. Do Período Meiji ao tempo presente, muitas
escolas Budistas foram criadas, algumas criadas com novos conceitos, outra
apenas como releitura das antigas religiões. Algumas escolas budistas passam a
se envolver intimamente com a política.
O Budismo Japonês é mais atrativo ao povo,
pois sua prática é mais simples do que os complexos rituais praticados nas
escolas mais antigas. Popularizando a salvação, o Budismo atinge um grande
número de seguidores, quebrando as barreiras entre os nobres e o povo, no que
se trata do Budismo. A escola Jodo Shu, também conhecida como Amidista, dá como
o caminho para a salvação a devoção ao Amida Butsu, ou Buda da Luz Infinita. E
o simples recitar do sutra “Namu Amida Butsu” tem o poder de levar a sua alma
para a Terra Pura( Daí o nome, Jodo Shu, que significa literalmente Terra
Pura). Já o Budismo Nichiren, ao recitar o título de um sutra, o Daimoku,
“Nam myoho rengue kyo”, torna a iluminação mais próxima. Ao compararmos
com os rituais complexos, sistema de mandalas, sutras e mudras utilizados
anteriormente, nos é claro porque o Budismo genuinamente japonês se torna cada
vez mais atrativo.
Atualmente, todas as escolas budistas no Japão
são Mahayana, exceto raríssimas exceções. A escola com mais seguidores é a Jodo
Shu, e a escola com mais templos é a Zen.
3 –
Origem do Zen Budismo
A origem do Zen Budismo nos leva aos primeiros
ensinamentos do Buda Histórico. É contada a história que em um de seus
ensinamentos, Siddartha apenas segura uma Lótus e nada diz. Apenas um dos seus
discípulos presentes consegue entender esse ensinamento, seu nome é
Mahakashyapa. Diversas escolas acreditam que o Sutra da Lótus é o sermão mais
importante dado por Siddartha, e nele reside a verdadeira compreensão do
Budismo e da Iluminação.
Mahakashyapa passa a ser o primeiro mestre
Zen, seus ensinamentos são passados de forma oral, de mestre para discípulo até
chegarem em Bhodiddarma no século V, o primeiro mestre Zen a sair da Índia e ir
para a China, transmitir os ensinamentos de Buda.
Conta-se que Bhodidharma após alguns
episódios, medita durante nove (9) anos dentro de uma caverna, olhando apenas
para a parede. Bhodidharma continua a transmitir o conhecimento Zen após o
episódio em que um jovem corta seu próprio braço para mostrar a fé nos
ensinamentos de Buda. Através de Bhodidharma, são contados seis (6) patriarcas
que são os principais difusores do Zen na China:
–
Bodhidharma (बोधिधर्म) (c. 440 –
c. 528);
– Huike (慧可) (487 – 593);
– Sengcan (僧燦) (? – 606);
– Daoxin (道信) (580 – 651);
– Hongren (弘忍) (601 – 674);
– Huineng (慧能) (638 – 713).
Destes patriarcas, os 2 últimos são os mais
importantes para a compreensão do pensamento Zen. Conta-se que Hongren estava
procurando um monge que pudesse sucede-lo com sucesso, na transmissão do
Dharma. Para procurar tal pessoa, Hongren propõe em seu mosteiro que todos
escrevam sobre a verdadeira natureza da iluminação. Todos os monges ficaram
descrentes, pois acreditavam que o Monge Shenxiu não poderia ser batido. Logo,
ninguém escreve o exercício proposto por Hongren. Como era de se esperar,
apensar Shenxiu escreve, e seu texto é pregado em uma das paredes do templo.
“O Corpo é a árvore de Bodhi,
a mente é um espelho brilhante.
Com cuidado a limpamos continuamente,
sem deixar que o pó acumule”.
Todos ficam perplexo, achando que nada poderá
ser mais coerente que o escrito por Shenxiu, no entanto, no dia seguinte, ao
lado do exercício de Shenxiu, aparece um desconhecido sem assinatura:
“Bodhi não é uma árvore
nem a mente um espelho brilhante
Já que tudo é vazio em essência
onde pode o pó acumular?”
Sim, esta era a suprema verdade sobre a
iluminação(Bodhi), mas o seu autor permanecia desconhecido. Posteriormente
descobre-se que o autor era o cozinheiro do templo, Huineng, que era
analfabeto, e havia pedido para um amigo escrever suas palavras. Huineng acaba
por tornar-se o novo patriarca do Zen na China, mas alguns monges ficam
descontentes e acabam por criar uma outra corrente Budista, onde Shenxiu é o
verdadeiro patriarca. Esta escola é extinta em pouco tempo.
Huineng é o último patriarca do Zen na China,
e consegue expandir os ensinamentos de Buda por toda a China. Suas palavras são
tidas como um marco na compreensão do Zen Budismo. Ao estudarmos linha por
linha em paralelo ao texto de Shenxiu, podemos ter uma primeira compreensão do
que é verdadeiramente o ensinamento Zen:
“O Corpo é a
árvore de Bodhi”;
“Bodhi não é uma árvore”;
Enquanto Shenxiu afirma a necessidade de
existência de um corpo para o caminho da iluminação, Huineng nega, a iluminação
não precisa de um corpo.
“…a mente é
um espelho brilhante”;
“nem a mente
um espelho brilhante”;
Huineng
agora nega a importância da mente no processo de iluminação.
“Com cuidado
a limpamos continuamente,
sem deixar
que o pó acumule”.
“Já que tudo
é vazio em essência
onde pode o
pó acumular?” .
Enquanto Shenxiu prega a necessidade de um
autocontrole da mente, Huineng diz que isto não deve existir, pois para o Zen
não existem intermediários.
É exatamente este o principal foco do Zen.
Pouco palpável, mas é exatamente isto que o Zen prega, a quebra com a lógica, a
mente não pode controlar o Zen, o Zen existe independente de qualquer coisa, de
qualquer meio. O Zen não é tangível pela intelectualidade, para compreender o
Zen deve se deixar de lado qualquer paradigma existente e apenas ser. Ao
primeiro contato nos é difícil compreender, mas ao estudar os métodos Zen, e o
Zen aplicado à algumas atividades, nos fica claro qual é sua finalidade, mesmo
que isso não seja possível na visão Zen.
4 – Zen Budismo
O termo Zen tem origem em Dhyanna, termo
sânscrito que significa meditação. Ao ser introduzido na China, o termo Dhyanna
tornou-se Ch’an, possivelmente este termo foi corrompido ao chegar no Japão, e
por sua similaridade sonora tornou-se Zen. Porém Zen não carrega mais o sentido
de meditar, para isto existe o nome Zazen, que seria o sentar Zen.
O Zen Budismo, como em outras escolas, busca o
caminho da iluminação. Esta iluminação, em japonês, recebe o nome de Satori ou
Dai-Kensho. Dai-Kensho seria um estágio avançado da iluminação, enquanto Kensho
é apenas uma iluminação parcial. O foco do Zen Budismo é dado na meditação,
entretanto, cada escola tem uma metodologia sobre meditação.
Alguns princípios utilizados no Zen são de
grande importância para a compreensão deste. Um deles é o princípio da
impermanência, ou seja, nada existe pra sempre. Outro princípio importante é o
da Natureza Búdica, qualquer pessoas é um buda em potêncial, somos todos
iluminados por natureza, porém temos que seguir este caminho de volta para a
iluminação, esta iluminação nos dá uma visão sobre a verdadeira realidade de
tudo. Este é a finalidade do Zen.
O Zen tornou-se popular na China, crescendo
absurdamente em número de templos, chegando ao ponto de que praticamente todos
templos Budistas na China eram da escola Zen. Após crescer na China, o Zen
atravessou as fronteiras, muitos templos foram criados no sudeste asiático e principalmente
na Coréia.
O Zen Budismo começou a ser introduzido no
Japão entre os séculos XII e XIII, sua aceitação foi de certa forma rápida,
como as escolas budistas japonesas, o Zen conseguia simplificar ainda mais a
iluminação. Sendo fácil de praticar e sendo acessível à população japonesa,
seja intelectualmente ou financeiramente. Criou-se também o acesso das mulheres
à religião, chegando ao caso de mulheres tornarem-se mestres Zen e dirigirem
mosteiros. Ou seja, o Zen entra no Japão com uma série de atrativos.
Existe um número limitado de escolas Zen de
expressão, restringe-se basicamente a Soto Zen e Rinzai Zen. Existem também a
escola Obaku Zen, que foi introduzida no período Tokugawa, pelas famílias
chinesas residentes no Japão, e atualmente foi criada em 1954 a escola Sanbo
Kyodan Zen, que na verdade é uma releitura das escolas Soto e Rinzai.
A Escola Rinzai, a primeira escola Zen a ser
introduzida no Japão, é levada em ao Japão por Myoan Eisai em 1191.
Inicialmente é uma releitura da escola chinesa Linji, mas posteriormente a
escola Rinzai cria uma identidade tipicamente japonesa. A escola Rinzai é
conhecida por ter um método abrupto, ou seja, que acelera o caminho para a
Iluminação. A iluminação é dada através da meditação sobre os Koans, frases que
fazem o praticante refletir sobre a verdade. Esta escola também dá ênfase no
trabalha árduo. Por tais motivos o Zen é adotado rapidamente pela classe de
Samurais, principalmente o Rinzai Zen, pois ao contrário de outras escolas, o
Zen pode ser praticado em qualquer lugar, em silêncio, sem necessidade de
grandes rituais. O foco da Rinzai Zen no trabalho árduo é adaptada à prática de
artes marciais, o que torna atrai ainda mais a classe de Samurais a praticarem
Zen. Pode-se dizer que o Zen define a identidade do Samurai.
A Escola Soto Zen é a escola Zen com mais
praticantes em todo o mundo. Foi criada por Dogen Zenji, e surge como uma
releitura da escola chinesa Caodong, e assim como a Rinzai, adquire a
identidade típicamente japonesa com o passar dos anos. Ao contrário da Rinzai,
a escola Soto torna-se mais popular entre os camponeses. A escola Soto não faz
o o uso de Koans, e também não faz uso de trabalhos árduos. O foco é dado na
meditação sentada, ou Shikatanza, que significa “apenas sentar-se”. A escola
também faz meditações andando ou Kinrin, e meditações enquanto realizam
pequenas atividades, como preparar o almoço, essa meditação chamam-se Samu.
No Zen como um todo, a meditação é o principal
método utilizado para atingir-se o Satori, entre uma escola e outra apenas o
enfoque da meditação é mudado, mas o Zen continua o mesmo. Entendendo os
principais métodos de meditação, podemos compreender a realidade Zen.
5-Koan
Koans são frases usadas pelos mestres, para
forçar seus discípulos a compreender a verdade do Zen, algumas frases são
famosas como:
“Sabemos o som de duas mãos batendo uma na
outra, mas qual o som de uma das mãos?”
Meditando sobre Koans, o praticante consegue
quebrar as barreiras que o prendem a realidade, não mais existem duas mãos, nem
uma mão. As mãos são duas e “são” uma ao mesmo tempo. O uno e o dual coexistem.
Esta é a realidade para o Zen, tudo que existe é Uno, mas ao mesmo tempo existe
uma individualidade, e não obstante, o tudo torna-se nada. Difícil de entender
ao primeiro contato, porém isso pode ser explicado com um outro Koan.
“O Zen é como o reflexo da lua dentro de um
lago.”
Portando uma certa poesia, este Koan nos dá a
verdade quando tentamos obter o zen de uma forma lógica. Um objeto glorioso
como a lua pode entrar em um lago sem criar uma onda sequer, mas se tentarmos
agarrar essa imagem deixaremos a água turva, de modo que não veremos mais a lua
como ela é. Essa é a realidade que o Zen prega, a iluminação não pode ser
obtida por um processo lógico. Este é um dos motivos na qual não existe um
texto sagrado sobre o Zen, não há como expressá-lo de forma lógica, o Zen só
pode ser vivido. Como diz esse próximo Koan.
“As palavras são como um dedo apontando para a
Lua; cuida de saber olhar para a Lua, não se preocupe com o dedo que a aponta”
.
Este Koan é de mais fácil interpretação.
Novamente a verdade é retratada como a lua, ao escrever, ou até mesmo falar
sobre o Zen. Corre-se o risco de olharmos para o dedo ao invés da lua, ou seja.
Este Koan diz dos perigos de se tornar um escravo das palavras, ao invés de
contemplarmos a verdade, e além disso, por mais que um mestre possa apontar a
lua, ele não pode olhar a lua pelo discípulo.
Estes Koans começam a deixam claro a filosofia
Zen, para se entender o Zen deve-se pratica-lo, pois ele não pode ser atingido
por caminhos intelectuais. Ao sentar e meditar sobre os Koans, o praticante
aproxima-se do Satori. Compreender o mundo como duas mãos que batem e fazem um
único som.
6- Zazen
Zazen é o método de meditação usado pela Soto
Zen, e ao contrário da Rinzai. Não se usam Koans. O Zazen procura o caminho
inverso. Ao sentar não se deve ter nada na cabeça, os pensamentos não devem
existir, e o mundo não será mais externo ao praticante. A prática do Zazen leva
ao Shikatanza, ou seja, apenas sentar. Quando o praticante atingir o nível de
que não faça mais nada além de sentar, ele estará apto a perceber a verdade do
mundo. E assim, atingir o Satori.
O Zazen deve ser praticado na posição de
Lótus, colocando o pé direito sobre a coxa esquerda, e o pé esquerdo sobre a
coxa direita. Por ser uma posição difícil, também pode se praticar Zazen em
Semi Lótus, onde só o pé esquerdo fica sobre a coxa direita. Também existe a
posição Birmanesa, onde as pernas tocam o chão do joelho aos pés, pode-se
realizar Zazen em Seiza, o modo japonês de se sentar ajoelhado, ou até mesmo
praticar sentado, caso seja difícil para o praticante ficar numa das posições
anteriores.
O Zazen na escola Soto zen é praticado virado
para a parede, ao contrário da escola Rinzai, onde os praticantes miram o
centro do Dojo, com os olhos semi-fechados, não tão abertos ao ponto de
dispersar e nem tão fechados ao ponto de dar sono. As mãos devem formar o Mudra
Cósmico ou Dhyanna Mudra, onde a palma direita vira-se pra cima e a mão
esquerda repousa sobre a mão direita, os polegares se tocam levemente. Este
mudra deve ser realizado à altura do Hara, ponto este que fica 3 dedos acima do
umbigo.
Ao atingir o Satori, o praticante apenas
senta, e mais nenhum sentimento, pensamento ou sensação irá atingi-lo. Assim
pode-se ter a compreensão da realidade.
Existe uma variação do Zazen, que chama-se
Kinrin, onde o praticante anda lentamente, enquanto faz um mudra na altura do
plexo solar. Existe também o Samu, onde o praticante faz uma atividade normal,
como preparar o almoço ou varrer a casa, mas tentando atingir alguma
iluminação. Em ambos os casos, a finalidade é a mesma do Zazen.
7-Zen
O termo Zen, como já foi dito, tem sua origem
no termo Dhyanna, que significa meditação. Apesar de não ter mais esse
significado, a meditação continua sendo a essência do Zen Budismo. A escola
Soto Zen muitas vezes diz usar o termo meditar por não existir um
correspondente melhor. Mas compreendendo os métodos usados e finalidades,
podemos retratar as escolas Zen como nulistas, ou seja, não existe uma grande
atividade, e os praticantes se abstêm de qualquer coisa que aconteça. Qualquer
assunto pode ser tratado com naturalidade, e independente do contexto, os
praticantes Zen não manifestam nenhuma reação ou opinião sólida. O Zen também é
retratado como religião iconoclasta, não dando importância a símbolos,
escrituras ou a personagens históricos. Existem relatos de monges que queimam
ou cospem em estátuas de Buda, isto pode ser interpretado de uma forma não
saudável pela sociedade, além do mais, têm-se a impressão que os praticantes
não tem respeito por seus mestres. As palavras são o meio mais poderoso de
transmissão de Zen, mas algumas delas podem ser interpretadas de forma errônea,
como já foi dito por um mestre Zen: “Se você encontrar o Buda, mate o Buda. Se
você encontrar o Patriarca, mate o Patriarca”. Frases e ações como essas devem
ser interpretadas com grande cautela.
Como acontece com o Budismo em geral, existe a
discussão sobre o Zen ser ou não uma religião. Discussões mais sérias são
levantadas em torno do Zen, como por exemplo, se ele é realmente um escola
Mahayana ou dá início a uma nova ramificação, ou ainda, o Zen ainda é Budismo,
ou é uma filosofia nova baseada no Budismo? Questões como essas podem ser
estudadas e nunca levantar uma resposta conclusiva.
O Zen tornou-se popular e gerou uma
esteriótipo japonês, onde todo japonês é Zen. O Japão como um país onde a
sabedoria transborda, e como fonte de grande espiritualidade. Devemos
reconstruir o conhecimento sobre o povo japonês, e evitar esse tipo de pré
conceito. Alguns estudiosos afirma que o Zen é o produto genuíno da sociedade
japonesa, a essência do povo japonês encontra-se no Zen. Será que figuras
populares como o Samurai justo e corajoso são reais, ou apenas um construção
idealizada? Será que o Japão sempre teve este comportamento, mesmo antes da
introdução do Zen Budismo? O Zen Budismo reconstruiu o Japão, ou o Japão criou
o Zen Budismo? Questões como essas devem ser levantadas para evitar uma
idealização da sociedade japonesa..
O Zen também é tema pra vários campos de
estudo, não só a antropologia, linguística e história. A psicanálise tem
estudos sobre o Zen, onde essa manifestação do desejo é dada como influência do
Ego (Vontade e desejo, livre de qualquer conceito moral), e os métodos Zen como
Koan e Zazen são instrumentos para construir um Superego(Superego é o que
suprime o desejo, ou seja, suprime o Ego), em função do Id (Personalidade do
Indivíduo).
Muito se tem estudado sobre alguns costumes e
artes Zen, como o Ikebana ou Kado, a arte dos arranjos florais. O chado(ou
sado) ou chanoyu, a arte de servir e apreciar chás. O shodo, a arte da escrita.
Ou até artes marciais como Aikido e Judo.
8- A arte e o caminho Zen
Ao ser introduzido no Japão, o Zen Budismo
leva consigo uma série de costumes e tradições que pouco a pouco passam a ser
incorporadas à identidade Nippônica.
A notável preocupação de encontrar o caminho
da iluminação extrapola os ritos religiosos e é encontrada em atividades pouco
ligadas ao Budismo. Algumas dessas práticas são levadas junto a introdução do
Zen no solo japonês, como é o caso da arte do chá. Outras são criadas e
desenvolvidas à partir de contextos filosóficos e históricos, como é o caso de
certas artes marciais. Mas qual relação existe entre tomar chá e atingir a
natureza búdica? Isso nos fica claro assim que compreendermos tais práticas.
A arte do chá, Chanoyu ou Chado, foi levada ao
Japão por monges chineses, estes cultuavam o hábito de tomar chá verde, tal chá
já existia no Japão, mas a sua qualidade era contestável.
O Zen pouco a pouco desenvolve um método
cerimonial de se apreciar o chá. Esste método visa a evolução espiritual e a
busca pelo caminho, como nos deixa claro o nome Chado, Cha significa Chá,
enquanto Do tem o significado de caminho. Então o Caminho do Chá estabelece uma
série de regras e uma norma de etiqueta que pode variar conforme a escola.
Em essência todas escolas seguem um padrão. Antes de começar o ritual do
chá propriamente dito, os convidados caminham por um jardim zen, ondem
contemplam a natureza, essa etapa visa a integração do homem à natureza,
fortalecendo o principio de unidade que existe no Zen. Antes de entrar na sala
de chá, os convidados lavam suas mãos e bocas. Este não é um gesto de
asseamento e sim um gesto simbólico de quebra com o mundo material, após esta
lavagem o convidado está apto a entrar na sala do chá. Ao entrar, o mundo deve
ser esquecido, a única preocupação deve ser com a cerimonia. O chá deve ser
apreciado, assim como os talheres e instrumentos usados, eventualmente se
apreciam arranjos florais e pinturas sumiê.
Ao se focar no chá, existe uma unidade entre o
convidado e a cerimônia, os dois estão unidos intimamente, todas as ações são
feitas com naturalidade e qualquer resquício do mundo exterior é deixado de
lado.
Essa idéia de unidade é exatamente o que o Zen
procura, não existe distinção entre o que é chá e o que é homem, os dois são um
só, e através da prática do Chado o praticante se torna apto a extrapolar esse
conceito chá-homem para homem-universo.
Outra prática interessante é o Ikebana ou
Kado, Ka significa flor enquanto Do novamente significa caminho. O mesmo
conceito do chá é aplicado aqui. Ao construir arranjos florais, o praticante
torna tal prática tão natural, que é incapaz de distinguir o praticante do
arranjo. Certas regras estéticas fazem parte do Ikebana, como o cuidado com os
ramos usados, seus tamanhos e direções. A regra principal é buscar o equilibrio
entre os três (3) galhos usados no arranjo. Mas no arranjo de Ikebana, os
galhos não são apenas galhos, são símbolos que representam, o Céus, a Terra e o
Homem. Ao buscar o equilibrio entre esses galhos, o praticante entra em equilibrio
com a iluminação (Céu), com o mundano (Terra) e o consigo (Homem). Essa tríade
é um conceito que foi englobado à partir do contato do Budismo com o Xintô.
As Artes Marciais também tem sua preocupação
com a iluminação. O Budo, onde Bu significa guerra, e Do significa caminho.
Busca trazer a iluminação ao praticante, através do treino de técnicas de
combate.
O Budo é uma adaptação do Bujutsu, Jutsu
significa arte ou técnica, a única finalidade do Bujutsu é formar soldados
aptos ao combate armado e à mãos nuas. Com o final da segunda guerra, tais
práticas perdem sua utilidade, e pouco a pouco as escolas marciais vão
desaparecendo. Com uma releitura Zen do Bujutsu, o Budo surge, adaptando
antigas técnicas de combate ao caminho Zen. Novamente o praticante deve atingir
um elevado grau na arte, que é impossível distingui-lo da técnica. Não existe
nenhum pensamento, todo o processo acontece de forma natural. Mais uma vez,
buscando a iluminação, o praticante deve interpretar a sua naturalidade técnica
como uma manifestação da postura que deve ser tomada em relação ao universo.
Existe um crescimento exagerado das artes Zen,
onde praticamente tudo pode ser praticado de uma forma a revelar o caminho da
iluminação. Também existe grande especulação e inúmeros livros sobre o modo Zen
de se executar ações diversas. Hoje podemos encontrar livros que relatam a
mente Zen na manutenção de automotores, ou até mesmo na direção
automobilística.
9- O Zen e o mundo
O Zen atualmente é praticado em quase todo o
mundo, a escola com o maior número de monges fora do Japão é a Soto Zen. Após
os anos 80, aumenta o interesse do mundo na sociedade japonesa, onde
muito da sua cultura acaba por se tornar uma moda. O mesmo acontece com o Zen.
Com a popularização das artes marciais, dos
samurais, ninjas e gueixas, o Japão se torna uma grande fonte de novidades. Em
oposição ao que já existe no ocidente, os costumes japoneses são generalizados
como espirituais, pacíficos. Muitas vezes podemos observar uma dicotomia entre
ocidente/oriente – bem/mal. Muitas das características adoradas pelo ocidente,
se deve a grande influência do Zen na sociedade japonesa.
Glossário
Amidismo –
Outro nome dado à escola Jodo Shu, devido à sua devoção ao Amida Buda.
Bhodi –
Iluminação.
Buda – O
Iluminado, mas comumente o termo é usado pra se referir à Siddartha Gautama.
Bukkyo – Budismo.
Butsudo – Budismo.
Butsu – Buda.
Dai-Kensho –
Maior nível que possa ser atingido pela iluminação.O mesmo que Nirvana ou
Satori.
Daimoku –
Sutra utilizado na escola Nichiren.
Dojo – Local
onde se pratica a meditação. Literalmente é o “lugar do caminho”
Kensho –
Primeiro estágio da iluminação, termo japonês.
Koan –
Frases usadas para forçar a compreensão do Zen..
Kinrin –
Meditação andando.
Lamaísmo –
Budismo Tibetano praticado pelos Lamas.
Mudra –
Símbolos que são realizados com as mãos ao se meditar.
Nirvana –
Iluminação. O mesmo que Dai-Kensho ou Satori.
Samu – Um
trabalho que é realizado com intuito de meditação.
Sangha –
Comunidade monástica.
Sutra –
Registros escritos das palavras proferidas por Siddartha Gautama.
Período
Asuka – Período da história japonesa que corresponde de 552-710.
Período
Heian – Período da história japonesa que corresponde de 794-1185.
Período
Kamakura – Período da história japonesa que corresponde de 1185-1333.
Período
Tokugawa – Período da história japonesa que corresponde de 1615-1868
Zazen –
Meditação Sentada.
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